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O swell das tendências

Assim como um marinheiro bem vivido sabe ler o vento, as ondas e outros sinais, existem olhares treinados que enxergam o que está por vir. São os chamados captadores de tendências.

14/Fev/2014 - Guilherme Pallerosi - São Paulo - Brasil

Estes pobres coitados devem quebrar a cabeça ao olhar o cenário de hoje. Captadores de tendência navegam o cotidiano, muito além do mercado ou moda eles buscam entender as mudanças nos comportamentos, das tecnologias, conceitos, prevenindo onde tudo isto vai dar. Mas com tanta coisa acontecendo, anda difícil prever o que está por vir. 

No universo de um esporte como o surfe, por exemplo, observamos uma diversificação das modalidades, sejam pranchinhas, pranchões, Tow in, Stand Up, Kite Surf, Kneeboards, body boards ou hand planes.

Em um mundo tão superlotado, qual significado adquiriu um esporte antigo como o surfe?

Um famoso autor analista das tendências sociais, Richard Dawkins explica o fenômeno como um gene que consegue se propagar, sendo responsável por mudanças culturais. Por exemplo, nos anos 60 um livro chamado Primavera Silenciosa (Silent Spring) simbolizou a inquietação de um grupo de ativistas preocupados com a forma como estamos nos relacionando com a natureza. As ideias evoluiram aos poucos, tornando-se parte da nossa cultura. Hoje vemos a influência daquele “gene” no movimento ecologista, nas leis ambientais, na política, na sociedade civil, nos produtos sustentáveis, assim como no estilo de vida das pessoas. A ideia original é a busca por comportamentos equilibrados, que recebeu o nome de sustentável.

A identidade comum à todas as modalidades do surfe é o gene de uma busca, um questionamento da vida moderna.

Um dos maiores ídolos do surfe moderno é o salva-vidas e big rider, Eddie Aikau. Ainda vivo era uma lenda, e teve um papel fundamental para o surfe de ondas grandes. Após o fatídico episódio da sua morte, virou herói.  Mas o que nos interessa é a trajetória deste vanguardista. No auge de suas conquistas como surfista, passou a dedicar-se às atividades de salva-vidas, além do projeto de reconstituição das grandes travessias, feitas nas canoas dos ancestrais polinésios. Eddie passou a ser um signo do surfe, principalmente depois de sua morte trágica, na tentativa de salvar a tripulação de um naufrágio. Buscava a tal essência perdida.

Não foi por coincidência que nos anos 80 começava um novo movimento entre surfistas profissionais ao redor do mundo. Cansados da pressão e limitações dos campeonatos, atletas e patrocinadores encontraram um meio termo: o freesurfe. Neste sentido, o movimento era uma volta à essência do esporte, graças à evolução das tecnologias digitais de comunicação, que permitiram divulgar imagens nas mídias virtuais, vinculando o estilo de vida do atleta à marca.

À frente dos freesurfers estava Tom Curren e a marca Rip Curl. Nos anos 90, o atleta tricampeão mundial abandonou o circuito no auge da carreira e encabeçou um projeto chamado The Search. Com um slogan destes a Rip Curl se tornou uma das maiores marcas do mercado. A ideia foi revolucionária, criou-se o mito da profissão perfeita, unindo uma vida simples de surfista com todos os confortos da modernidade. Mas nem tudo é o que parece, sabemos que os atletas-propaganda também possuem uma agenda rígida, ditada por swellse temporadas de ondas. Mas foi uma grande sacada, o estilo de vida do surfe vinculado a uma marca comprovou a força desta imagem.

O lema da busca pela onda perfeita possui um signo que transcende, remete uma inquietação dos nossos tempos. A essência (ou o gene) daqueles questionamentos dos anos 60 surge na forma de urgência de um estilo de vida equilibrado.

Um indício recente dos questionamentos do surfe é o fenômeno iniciado pelo shaper Tom Wegener. Este californiano radicado na Austrália revolucionou o design de pranchas ao reinventar as Alaia. Tom já seguia a tendência de construir pranchões semelhantes aos usados durante os anos 50 e 60, que possibilitavam um surfe muito divertido, principalmente em certos tipos de onda. Após uma visita ao Havaí, começou a reconstruir os principais modelos de pranchas de madeira até chegar à ancestral Alaia. Melhorando o desenho ele descobriu uma nova modalidade de surfe. Uma tabua de madeira sem quilhas possibilita maior conexão com as ondas e o mar. A grande inovação das Alaias é justamente a simplicidade do projeto. 

Enfim, no surfe sempre vai existir um núcleo inquieto, um gene mais antigo que imaginamos, dos povos polinésios talvez, buscando a ilha perdida, o paraíso, o equilíbrio, a mente sã. E assim, as tendências do esporte apontam para duas direções, a diversificação das modalidades, com uma ampliação do mercado, e a consolidação de uma identidade, questionadora da vida moderna e do mainstream.

Assim diria um marujo das tendências, sentindo a brisa do swell batendo na cara...